Uma obra-prima merece ser exposta, vista e admirada - 21/12/2025 - O Mundo É uma Bola
Leônidas da Silva (1913-2004) mostra em 1988 foto de uma bicicleta que deu em São Paulo x Juventus no Campeonato Paulista de 1948 - Gil Passarelli - 7.set.88/Folhapress

Há gols e gols. Uns ordinários, outros incomuns. Os de pênalti, os de falta. Uns bonitos, outros nem tanto. Gol feio, o artilheiro e tricampeão mundial Dadá Maravilha, 79, ex-Atlético-MG e muitos outros, disse que não existe e que “feio é não fazer gol”.

Entre os bonitos, há também gols e gols. Narradores na TV exageram ao classificar um gol de “golaço” (na voz, “golaaaaaaaaaaaaaaço!!!!!!, em altíssimo tom, como se fôssemos surdos), banalizando o que não se deveria.

Os gols mais raros são muito apreciados, como o de letra, o de escorpião, o de voleio, o de peito, o de calcanhar, o olímpico.

E tem o de bicicleta. Aliás, há locutores que tratam como de bicicleta o gol de meia-bicicleta. Não deveriam.

Para que seu gol seja classificado como de bicicleta, o jogador precisa executar com perfeição o movimento da jogada que aprendemos ter sido criação de Leônidas da Silva, o Diamante Negro –porém não foi assim, como expus em texto anos atrás. O brasileiro, com todos os méritos, a popularizou.

Entre os de bicicleta, há gols e gols. Tive a felicidade de ver um belíssimo ao vivo, no estádio, em final de Champions League, do galês Gareth Bale, pelo Real Madrid, contra o Liverpool em 2018, em Kiev (Ucrânia), depois de cruzamento do lateral Marcelo.

Foi também em 2018, semanas antes, que Cristiano Ronaldo marcou um espetacular, pelo mesmo Real Madrid de Bale, contra a Juventus, em Turim. A torcida italiana, pasma, aplaudiu o astro português.

Quando menciono Cristiano Ronaldo, quase automaticamente penso em Messi, o outro supercraque deste primeiro quarto de século 21. O argentino jamais fez um gol de bicicleta, apesar de ter gente que considere como um o que ele fez pelo PSG contra o Clermont em 2022, que não passou de uma puxeta.

Sobre o golaço do CR7 em Buffon, o que mais impressionou, além da plasticidade do lance, foi o salto do lusitano. Ele chegou a 2,38 m de altura.

Achava que não veria de novo algo tão sensacional. Só que o futebol tem o poder de surpreender, e vi. Não só tão, como mais sensacional.

O britânico Scott McTominay, 29, maravilhou o mundo com seu gol pela Escócia, no Hampden Park, em Glasgow, no mês passado, na partida contra a Dinamarca que classificou o país para a Copa do Mundo de 2026.

O cruzamento veio da direita, e o meio-campista de 1,91 m (Cristiano Ronaldo tem 1,89 m) saltou a 2,53 m para executar o malabarismo. Uma bicicleta perfeita, a mais embasbacante que já vi. Uma execução, desafiando a lei da gravidade, tão brilhante que, estou certo, ele, nem em jogo nem em treino, conseguirá repetir.

McTominay, “pintando com os pés”, constituiu uma obra de arte, uma obra-prima de fazer inveja a um Da Vinci, a um Van Gogh, a um Michelangelo. E, se é uma obra primorosa, merece ser exposta, vista e admirada.

Dito e feito. A bicicleta de McTominay virou quadro, que ficará em exposição para o público, gratuitamente, até o dia 5 de janeiro, na área mais nobre da Galeria Nacional Escocesa de Retratos, em Edimburgo, a capital da Escócia. A autoria do clique é de Ross MacDonald.

Alçado repentinamente a artista, McTominay, que defende o Napoli, é titularíssimo do terceiro adversário do Brasil na Copa de 2026. Alô, Clodoaldo, alô, Marquinhos, alô, Gabriel Magalhães… Cuidado com ele na bola aérea, dando ou não bicicleta. O aviso está dado.

Fonte: Folha de S.Paulo

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