Taça Jules Rimet (1929-1983). Ela tem história. Criada no ano anterior ao da primeira Copa do Mundo, em 1930 (no Uruguai), recebeu o nome do então presidente da Fifa, um francês.
Uma taça muito bonita e emblemática. Sua imagem representa Nice, a deusa grega da vitória, e o troféu ficaria em definitivo com o país que ganhasse primeiro três Copas do Mundo.
Passou pelas mãos de capitães em oito Copas, incluindo as dos brasileiros Bellini, em 1958, e Mauro Ramos, em 1962, antes de chegar às de Carlos Alberto, em 1970. Com a conquista do tri, no México, a taça do mundo era nossa (“com brasileiro não há quem possa”), a Jules Rimet viria para o Brasil.
E veio. Para se tornar, anos depois, alvo de um dos roubos mais célebres de que se tem conhecimento.
Ladrões invadiram a sede da CBF, na rua da Alfândega, no centro do Rio, na noite de 19 de dezembro de 1983, uma segunda-feira, renderam o único segurança, abriram a redoma de vidro em que ela ficava e a levaram.
O plano tinha sido previamente elaborado, com o cabeça da operação sendo Sérgio Pereira Ayres, o Peralta. Seus comparsas eram José Luiz Vieira, o Bigode, e Francisco Rivera, o Barbudo. Estes últimos foram os que executaram o roubo.
O grupo tinha informações sobre o frágil esquema de segurança. Não havia alarme ou sensores e não era necessário nem quebrar o vidro que abrigava a Jules Rimet, bastava removê-lo.
O objetivo da quadrilha era repassar a taça para um comerciante de ouro e obter dinheiro. Isso, de acordo com depoimento dos ladrões, presos posteriormente, aconteceu.
O comerciante, atuante no Rio, era um argentino, o ourives Juan Carlos Hernández, que trabalhava com fundição de metais.
Assim, o derretimento da Jules Rimet ficou na memória de todos, “ela virou barras de ouro”. Isso, virar barras de ouro, não ocorreu. A quantidade de ouro do troféu de 3,8 kg era mínima (cerca de 100 gramas). Era de prata, banhado a ouro.
A taça foi derretida? Jamais foi comprovado. A trinca de ladrões assegurou tê-la vendido a Hernández, que negou à polícia esse acontecimento. Ele não foi condenado, por falta de provas.
Desse modo, falta conclusão fundamentada do paradeiro da Jules Rimet. O caso foi judicialmente encerrado em 1988, e tudo permaneceu no terreno das suposições.
Passado tanto tempo, mesmo que se quisesse revisitar oficialmente o caso da famosa taça, não seria possível, pois dois dos bandidos morreram e o terceiro (Bigode) sumiu do mapa, assim como o argentino.
A revisita fica por aqui mesmo. Fui instigado a fazê-lo por Sérgio Zandoná, responsável pelo filme “O Argentino Que Derreteu a Jules Rimet” (disponível no YouTube), que banca a versão do título.
Particularmente, considero verossímil. Sem um fato novo, estou convencido de que a Jules Rimet virou sucata metálica. E que foi o tal argentino a fazê-lo.
A suspeita ganha corpo ao se saber que, no começo de 1984, Hernández batizou loja com o nome de Aurimet. Sugestivo. A junção de auri (“de ouro”, em latim) com rimet (o sobrenome da taça) leva a uma leitura cabal: deboche, provocação.
A Jules Rimet morreu na meia-idade, aos 54 anos, vítima de um assalto. Entretanto segue viva, quase centenária, em muitas memórias, admirada e dona de uma história para lá de saborosa.
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Fonte: Folha de S.Paulo